Um dos grandes temas em discussão para as Indústrias dizia respeito sobre a incidência de Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) sobre mercadorias roubadas – infelizmente uma situação comum em diversos setores industriais, como os de cigarro, bebidas e eletrodomésticos, entre outros.
Atualmente temos 4 julgados no STJ, os quais, com o passar do tempo trouxeram uma mudança de posicionamento.
O primeiro caso é do REsp 734.403, de 22 de junho de 2010, envolvendo a Philip Morris Brasil. Neste julgado o entendimento foi de que como a mercadoria seria vendida no país, “o roubo ou furto de mercadorias é risco inerente à atividade do industrial produtor. Se roubados os produtos depois da saída (implementação do fato gerador do IPI), deve haver a tributação”, alegou o relator, ministro Campbell Marques. “O prejuízo sofrido individualmente pela atividade econômica desenvolvida não pode ser transferido para a sociedade sob a forma do não pagamento do tributo devido.”
Em seu voto o ministro entendeu que a legislação tributária define o fato gerador do IPI como sendo a saída do produto industrializado do estabelecimento industrial ou equiparado, seja qual for o título jurídico de que decorra essa saída do estabelecimento produtor (art. 46, II, do CTN; art. 2º, II e §2º, da Lei n. 4.502/64; e art. 32, II, do Decreto n. 2.637/98 – RIPI-98).
Já em 21 de junho de 2012, no Resp 1.203.236, houve uma mudança de entendimento, com o voto do Ministro Herman Benjamin, o qual asseverou que “fato gerador do IPI não é a saída do produto do estabelecimento industrial ou a ele equiparado. Esse é apenas o momento temporal da hipótese de incidência, cujo aspecto material consiste na realização de operações que transfiram a propriedade ou posse de produtos industrializados”. Não se pode confundir o momento temporal do fato gerador com o próprio fato gerador, que consiste na realização de operações que transfiram a propriedade ou posse de produtos industrializados.
Mais adiante preconiza que a antecipação do elemento temporal, criada por ficção legal, não torna definitiva a ocorrência do fato gerador, que é presumida e pode ser contraposta em caso de furto, roubo, perecimento da coisa ou desistência do comprador.
Em relação ao RESP 1.184.354 – RS, de 16 de maio de 2013, de relatoria da Ministra Eliana Calmou entendeu que o legislador, quando da edição de lei para a instituição de um tributo, deve atentar para a adequada indicação dos critérios da regra matriz de incidência tributária, entre eles os critérios material e temporal. O “critério material corresponde ao fato social sobre qual incidirá a norma tributária. Já o critério temporal corresponde ao momento, no tempo, que essa norma incidirá sobre aquele fato social, dando origem à obrigação tributária cujo objeto é próprio tributo”.
Ocorreu que, neste processo, a Fazenda Nacional considerou ocorrido o fato gerador do IPI no momento em que as mercadorias produzidas pelo recorrente saíram do estabelecimento comercial, isto com fundamento no art. 46 do Código Tributário Nacional abaixo transcrito:
Art. 46. O imposto, de competência da União, sobre produtos industrializados tem como fato gerador: II – a sua saída dos estabelecimentos a que se refere o parágrafo único do artigo 51;
Ocorre que, analisando esse dispositivo em conjunto com o art. 153, §3º, inc. II, da Constituição Federal (§ 3º – O imposto previsto no inciso IV: II – será não-cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação com o montante cobrado nas anteriores), tem-se que o fato gerador do IPI não é simplesmente a saída do produto do estabelecimento industrial ou a ele equiparado. Este seria apenas o momento (critério temporal) da incidência da norma sobre a hipótese fática indicada pelo legislador constituinte (critério material), qual seja, a realização de operações que transfiram a propriedade ou posse de produtos industrializados.
Já o Recurso Especial 1.552.257 – RS, de 08 de novembro de 2016, com relatoria da Ministra Assusete Magalhães este entendimento foi de acordo com o entendimento desta Corte, ou seja não deve incidir IPI sobre a venda de produtos, na hipótese de roubo ou furto da mercadoria, antes da entrega ao comprador, porquanto não configurado o fator gerador, com a conclusão da operação mercantil. Precedentes: STJ, AgInt no REsp 1.190.231/RJ, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, DJe de 17/08/2016; REsp 1.184.354/RS, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, DJe de 03/06/2013; REsp 1.203.236/RJ, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe de 30/08/2012”
De início, cumpre registrar que, na origem, tratava-se de MS, impetrado por PHILIP MORRIS BRASIL INDÚSTRIA E COMÉRCIO LTDA e filiais, em face do DELEGADO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL EM SANTA CRUZ DO SUL/RS, com o objetivo de reconhecimento da inexigibilidade do IPI sobre produtos industrializados e comercializados pelas impetrantes, que tenham sido objeto de furto ou roubo ocorrido após a saída das mercadorias dos estabelecimentos. Assim, na esteira da jurisprudência firmada no STJ, não deve incidir IPI sobre a venda de produtos, na hipótese de roubo ou furto da mercadoria, antes da entrega ao comprador, porquanto não configurado o fator gerador, consistente na conclusão da operação mercantil. Com efeito, apesar de a legislação prever, como critério temporal para incidência do IPI, a saída do produto do estabelecimento industrial (art. 46, II, do CTN), esta não configura o fato gerador da exação, mas apenas o momento temporal da hipótese de incidência, uma vez que o aspecto material do fato gerador é a operação de transferência da propriedade ou posse dos produtos industrializados. Sendo assim, a ocorrência do fato gerador do IPI, que é presumida, no momento da saída da mercadoria, por ficção legal, para fins de controle tributário, não se realiza, nos casos de roubo ou furto da mercadoria, antes de sua entrega ao adquirente.
Destarte, o fundamento adotado atualmente é de que a mera saída de mercadoria do estabelecimento comercial ou a ele equiparado não caracteriza, por si só, a ocorrência do fato gerador do IPI. Para os ministros, é necessária a efetivação de operação mercantil.