Celular na mão é risco na certa para motoristas, mas também para os pedestres
“Você costuma olhar o seu celular pela manhã antes ou depois de ir ao banheiro?” A frase de um documentário sobre a relação humana com as redes sociais escancara uma verdade mundial: o celular faz parte de quase todos os minutos da vida moderna, da hora em que a pessoa acorda até minutos antes de dormir (e tem gente que deixa o aparelho embaixo do travesseiro…)
No Brasil, há mais smartphones do que habitantes: são 230 milhões de celulares em uso. O único problema é que toda essa conexão pode gerar acidentes se usada nos momentos ou locais inadequados – e o trânsito é um deles.
Transporte digital
Todo mundo sabe que não deve utilizar o celular enquanto dirige. Está no Código Brasileiro de Trânsito e até nos alertas que os próprios aplicativos de mobilidade emitem quando identificam que o motorista está em movimento enquanto digita. Mas é preciso lembrar também aos pedestres sobre essa recomendação. “Andando e olhando o celular você se distrai e não percebe o que está acontecendo à sua volta”, alerta a tenente do BPTran, Mayra Tonelli.
Pode parecer uma dica básica: “olhe por onde anda!”, mas na prática, o aparelho nas mãos, as mensagens notificadas e até mesmo a música nos fones de ouvido são algumas distrações bastante comuns nas ruas. E esse é o principal ingrediente da imprudência, que resulta em acidentes. É mais difícil fiscalizar ou aplicar sanções a pedestres por estarem distraídos. Não existe, inclusive, uma regra para que o pedestre seja responsabilizado por um acidente caso esteja meio “avoado”.
Mas a distração pode levá-lo a atravessar sem olhar atentamente a via ou até mesmo se colocar em situações de risco. “Se o pedestre atravessar fora da faixa, ela estando a menos de 50 metros, e causar um acidente, ele pode até mesmo responder pelos danos causados ao veículo, além de o motorista não ser responsabilizado”, afirma o advogado especialista em direito do trânsito Roberto de Faria. “É claro que isso não justifica um atropelamento que poderia ter sido evitado pelo condutor, mas é uma atitude que prejudica a posição do motorista”, reforça o consultor jurídico Cristiano Baratto. Na prática, vale a mesma dica para todas as outras ações no trânsito: pensar no outro, ter mais empatia.
Sob o olhar de quem caminha
“Todo motorista um dia foi pedestre, ninguém nasceu com CNH, mas as pessoas esquecem disso”. O desabafo é da educadora física Thauana Padilha, que, embora tenha carteira de habilitação, não costuma dirigir. Sempre que possível, ela vai aos destinos a pé. “Muitos motoristas têm empatia zero. Às vezes está chovendo e as pessoas nem mesmo param para a gente atravessar na faixa de pedestre. E o motorista está dentro de um carro, confortável, enquanto você está lá com o guarda-chuva na mão. Falta se colocar no lugar do outro”, pontua.
Por outro lado, além do benefício físico da caminhada, ela também destaca momentos em que andar se torna mais rápido do que dirigir. “O trânsito tá lá, parado e você vai passando todo mundo. Quando eu trabalhava em uma academia perto de casa, eu chegava entre sete a oito a minutos andando, e se fosse de carro demoraria muito mais”. Por atuar como influenciadora nas redes sociais, ela costuma mostrar o trajeto e “conversar” com os seguidores no caminho, mas somente nos trechos em que há calçada, longe da rua.
E se não há espaço?
As áreas de circulação dos pedestres devem ser mantidas em boas condições de visibilidade, higiene e segurança. Roberto de Faria recomenda que, caso um trajeto não conte com calçada adequada, o cidadão reclame seus direitos. “A responsabilidade pelas áreas de circulação dos pedestres é da administração pública, que responde de maneira objetiva”, orienta.
Thauana, por exemplo, brigou por uma faixa de pedestres na rua onde mora, a Avenida Nossa Senhora Aparecida, em Fazenda Rio Grande, na região metropolitana de Curitiba. “Não é uma garantia de que os motoristas vão parar, mas eu percebi que depois que a minha solicitação foi atendida aumentou o número de pessoas que param para os pedestres atravessarem. Isso educa, querendo ou não.
A educação, mais uma vez, também é um ponto de destaque na fala do especialista. “A nova alteração na lei de trânsito prevê o investimento do valor de multas em programas de educação. Com isso, vamos formar cidadãos melhores, que respeitem as regras de trânsito e entendam os perigos desde a base, desde a infância”.
E o celular?
Ele não precisa ser um vilão, pelo contrário. As conexões digitais se tornaram grandes aliadas em tempos de isolamento e distanciamento social. A internet móvel também ajuda – e muito – a encurtar caminhos, desviar de congestionamentos e até orientar sobre trechos que precisam de mais atenção, no caso dos motoristas. Para os pedestres, o smartphone também é uma ferramenta interessante, seja para contar os passos ou distância percorrida, receber uma chamada urgente ou até mesmo se orientar pelo GPS.
A questão é prudência. “A tecnologia tem que ser usada a nosso favor, de forma positiva. Ela muda a nossa vida de modo geral”, avalia o coordenador de educação do Detran-PR, Michael Bogo. Então, que seja usada para mudar a vida para o bem – e aumentar a segurança de todos, não o contrário.
Fonte: Tribuna do Paraná